No meio do caminho tem muitas barragens de lama

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Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.
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Carlos Drummond, Confidência do itabirano


A cada dois anos, em média, uma barragem de rejeitos se rompe em Minas. Todos lamentam, fazem muitas doações para os atingidos e... esquecem. Até o próximo rompimento.

Vá chamar as pessoas para uma reflexão sobre os mil fatores encadeados que acontecem até a lama transbordar. Desde estilo de vida até apoiar pessoas que defendem políticas como a flexibilização de leis ambientais e trabalhistas, tributação e paraísos fiscais. Tente tirar alguns amigos do lugar quentinho da consternação pelas vítimas. Se quiser se arriscar mais, chame essas vítimas de trabalhadores.

O que leis trabalhistas tem a ver com barragem de lama? Tudo. Veja como é feita a contenção de riscos de uma barragem e fica simples de entender.

E os paraísos fiscais e o sistema tributário e o capital financeiro? A ligação entre todos esses fatores é bem mais fácil de entender do que nos fazem acreditar os "especialistas" e "economistas". Porque se todos entendessem seria um perigo...

Ontem me dei ao trabalho de fazer uma pequena enquete entre amigos, para saber o que pensavam da lama da Vale e qual seria a solução. Dá para resumir as respostas assim: consternação pela tragédia das vítimas (pessoas, animais, água, plantas), cadeia para algum responsável (engenheiro, presidente de empresa) e multa.

Alguma reflexão sobre responsabilidade pessoal? Como conhecer propostas de parlamentares mineiros sobre mineração? Ainda bem que a enquete foi à distância... Os mais amáveis me acusaram de indiferença por estar pensando "nessas coisas" ao invés de chorar pelas vítimas.

Enquanto não entendermos que a morte das abelhas, a prostituição de wall street, os três carros na garagem da família de três pessoas, o desprezo pelo conhecimento, a liberação de agrotóxicos, a aceitação de que existem humanos de segunda classe, são fatores conectados que desembocam no cemitério de lama aqui ao lado, resta-nos encher a dispensa da caridade, pois daqui a 1 ou 2 anos ela será novamente demandada para acalmar a nossa angústia e seguir em frente.

Esse pequeno curso de economia, dividido em 14 capítulos de 10 a 15 min., do prof. Dowbor, é perfeito para o momento. Ajuda a entender muitos fatores conexos, de forma simples, sem economês. Inclusive ele usa o estouro da barragem de Mariana como exemplo da lama no caminho que seguimos. Convido-os a assistir e divulgar.

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