Ondas digitais

É preciso observar os kpoppers! E entender.

Eles formaram uma dessas ondas na internet que é preciso observar, chamar a molecada e levar a sério. E rápido. Porque é onda. Se dormir na praia, quando acordar a onda já arrebentou e deixou Trump, Bolsonaro, Brexit.

Bom momento para rever a história da Cambridge Analytics e Steve Banon. Ela ficou cristalina desde a eleição do Trump. Mas até o Congresso dos EUA perdeu a chance de acordar, na CPI do facebook, porque os assessores dos deputados não sabiam o que perguntar a Zuckerberg. Aliás, não deveria ser o pessoal da tecnologia a assessorar os parlamentares nessa qüestão aí, e sim a comunicação e a psicologia. Foi tipo chamar câmeras, designers, editores de imagem para entender o jornalismo do jornal nacional da globo.

Os kpoppers são uma dessas ondas digitais, assim como os manifestos vazios de propostas recentes no Brasil (70%, chega, juntos), que foram desperdiçadas porque nossos progressistas (coloque aqui o seu preferido) deixaram passar com o argumento de que as ondas não tinham conteúdo.

É verdade, mas o conteúdo poderia vir se eles surfassem a onda. Perdemos todas, exceto Ciro Gomes, que parece mais bem assessorado, e está surfando a #Somos70%. Estou em um grupo do facebook com 240 mil pessoas apoiadoras do 70%. Fiquei surpresa quando vi que o grupo foi criado em 2018. Como assim?, se o 70% nasceu há 1 mês. Fui ver. O grupo se chamava Rondônia com Ciro Gomes e foi criado em 2018. Há 1 mês mudaram o nome para Somos 70%, alteraram o objetivo e começaram a convidar pessoas. É o Ciro surfando. Fazendo certinho.

Os kpoppers são uma legião de adolescentes espalhados pelo mundo que idolatram aquele horror de música Sul Coreana, k-pop, e convivem na internet. Andam e se comportam em bando, como é normal em adolescentes. Inventaram recentemente uma ação digital que chamam de ruído na comunicação, baseada nas interferências dos sistemas de rádio da segunda guerra, quando um adversário interceptava uma mensagem e inseria uma distorção para que ela chegasse comprometida do outro lado. Eles fazem isso, por exemplo, inutilizando rachtags. Assim: pegam a #TodosComBolsonaro e usam para encher a internet com textos contra Bolsonaro. Isso a inutiliza e ainda chega a milhões de apoiadores que seguem o TodosComBolsonaro.

Como são muitos e não fazem nada da vida, podem brincar com isso o dia todo e formar as ondas. Sim, brincar. No caso mais recente, resolveram esvaziar o comício inaugural da campanha de Trump. Compraram 1 milhão de ingressos para um ginásio em Tulsa, Oklahoma, onde eram esperadas 20 mil pessoas. Ninguém sacou. Tem artigo de macaco velho como o Pepe Escobar dizendo que Trump estava eleito, pois apareceu 1 milhão de interessados no comício onde se esperava 20 mil. No fim, pela ação da molecada, Trump voltou arrasado pelo fracasso do evento. Compareceram 7 mil apoiadores.

Só depois se descobriu que foi molecagem dos kpoppers.


Quem vai surfar a onda vazia de propostas desses adolescentes? Talvez ninguém, talvez o próprio Trump, talvez o adversário dele. Não se sabe. Será quem perceber, chegar primeiro e conseguir surfar. Aliás, o mesmo que aconteceu aqui, na esfera analógica, em 2013. Quem surfou a onda das ruas foi a direita, depois derrotada pela extrema direita que surfou nas notícias falsas. O movimento de 2013, cheio de nuances, muitas justas, progressistas, foi capitalizado pela direita (não digo cooptado porque não é a mesma coisa). Perceberam rapidamente a onda se formando, inflaram, expulsaram a esquerda - que abdicou da disputa -, colaram o discurso anti corrupção e anti PT e... surfaram.

Nada disso afasta a necessidade de projeto nacional, planejamento, quadros, organização, etc, tudo aquilo que sabemos necessário para disputar legitimamente uma eleição e depois governar. Mas também é preciso vencer eleições, certo? As ondas digitais são uma realidade, mostraram-se fator decisivo na eleição do Trump, Bolsonaro, na exclusão do Reino Unido da União Européia. Quem não compreender como se formam e aprender a surfá-las continuará levando caldo. Parece que a direita e a extrema direita pegaram o jeito e estão surfando...

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